quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Xadrez - Os pais "de mau gosto"


Este é um filme de que gosto muito, e não me canso de vêr.
Em Portugal ficou conhecido com o nome de "Shine-Simplesmente Genial" e passou quase despercebido. O actor principal ganhou 1 Óscar para a melhor interpretação. Uma interpretação notável !
Tinha-o filme em VHS, mas há dias deu-me para pesquisar na net se haveria algum DVD à venda, e a bom preço.
Consegui encontrar um original quase novo, com o selinho respectivo e que adquiri por 1,75 €. Uma autêntica pechincha! (para mais, comprei outros 2 nas mesmas condições por 1,5 € -cada).
O meu blog tem no título "de mau gosto", e certamente não me referia À notícia do F.Carapinha, ou a nenhuma das outras que publiquei antes desta.
Esse rótulo tem a ver com alguns pais que procuram fazer de uma forma absolutamente doentia, com os seus filhos, aquilo que nunca conseguiram na sua vida.
Nessa fase, acham que o filho é um génio absoluto porque ganhou o torneio de Sub 8 ou Sub 10 em que participaram 7 ou 8 petizes que mal sabiam colocar as peças.
Durante uns anos, incentivam os míudos a ganhar a qualquer preço, mesmo que os privem da liberdade de ter uma infância normal.
Mais tarde, virá a desilusão...
1º porque os miudos começam a pensar pela sua cabeça e acham que há coisas muito mais interessantes para lá do xadrez.
2º vão constatar que não são nenhuns Kasparovs portugueses e que existem centenas de jovens que são tão bons ou melhores que eles.
3º o xadrez, nessas idades, por "obrigação" nunca deu bom resultado, e provavelmente mais tarde nem quererão ouvir falar de xadrez.

No filme, vê-se perfeitamente o resultado de um pai ditador que transformou o filho num cãozinho amestrado, e as sequelas que deixou em ambos.

Podem ver neste link Rachmaninoff - Piano Concerto n. 3 Horowitz- Mehta 1978 a violência que foi obrigar um adolescente a tocar a peça mais difícil que pode ser executada num piano.
Horowitz é um dos mais virtuosos pianistas do Mundo. Se virem o vídeo até ao fim, vão ver a estrondosa ovação (*a) que recebeu e o elevadíssimo grau de dificuldade da peça tocada.
O "rapaz" em que o filme se baseou existe mesmo e ainda é vivo, e pode ser visto neste link David Helfgott at the Octagon já adulto.
Se conseguirem o filme, podem comparar a representação quase perfeita do actor, e o estado em que ficou David Helfgott. Atenção que o "pai-ditador" é ficção, e na realidade o pai não era assim.
Vejam o filme e vão perceber a razão de ser deste artigo! Um filme a não perder ! Ah.. e tem 1 cena de uma partida de xadrez entre o Pai e David Helfgott enquanto jovem.


Este artigo tem uma razão de ser, e o tal "mau gosto" tem a ver com algumas personagens que gravitam em torno do xadrez.
Há uns anos, calhou-me defrontar num torneio de semi-rápidas uma miuda sub 12 ou sub 14, que foi campeã nacional, tinha treinador(es) e os pais achavam que seria mais ou menos a Judit Polgar portuguesa.
Lembro-me que jogamos uma Francesa e fiquei em estado lastimável na abertura. Acho que só não abandonei por vergonha :)
Mas, tinha o pressentimento, que nessa altura os "treinadores" (acho que já mudou um pouco) ensinavam a teoria das aberturas principais, e esperavam que a vantagem adquirida na abertura chegasse para ganhar a outros jovens que não tinham tanta preparação.
Assim se fizeram vários campeões nacionais que apenas sabiam algumas aberturas...e pouco mais.
Sabendo isso, continuei a jogar, e após o meio-jogo estava com 1 cavalo e Rei , contra rei e 2 (ou 3) peões da mocinha.
O meu rei dominava as casas de avanço dos peões, e chegamos a uma posição que só podia dar empate. O rei da adversária não se podia afastar do peão atrasado, pois o meu rei chamar-lhe-ia um figo, e o outro teria sempre certo o sacrifício do cavalo.
Acabei por ter pena da rapariga, que se notava estar perfeitamente incomodada com o ar ameaçador do seu progenitor.
O senhor, ladeava a mesa com uma cara de pau,qual gigante Adamastor e no seu semblante via-se que a moça se acaso não ganhasse ia ter de as ouvir, no mínimo.
Ainda hoje me arrependo de não ter convidado o referido senhor a sentar-se e conseguir ganhar aquela partida com o jogo da filha.
Se não conseguisse, seria possivelmente noticiado que...( usem a imaginação !) para aprender que se deve tentar ganhar, mas não a qualquer preço.
Claro que pouco tempo depois, a rapariga deixou de jogar xadrez, pois nunca mais a vi .

(*a) Este mesmo vídeo está disponível na net, onde a ovação de pé se prolonga por mais de 3 minutos, obrigando Horowitz a vir dos camarins ao palco por 2 ou 3 vezes !

1 comentário:

António Viriato Ferreira disse...

Caro, GM Russowsky,
Aguardo ansiosamente mais "posts" de um dos Grandes-Mestres na prosa do xadrez nacional.
"Shine" é realmente um filme extraordinário e agradeço-lhe a sua sugestão já a mim feita anteriormente.
A menina da partida em referência recordou-me outras situações lamentáveis com outros "meninos" estando eu do outro lado do tabuleiro.
Fica o abraço e um apelo a uma certa dose de anarquia que nestas coisas do xadrez sempre faz falta.
Viriatovitch

E que tal uma partidinha de Poker ???